Justiça bloqueia R$ 7,6 milhões da Fundação Renova
Valor destina-se a municípios impactados por rompimento de barragem e pela crise.
14/02/2019 15h18 – Atualizado em 14/02/2019
Os municípios de Rio Doce, Barra Longa e Santa Cruz do Escalvado terão acesso, cada um, a R$ 2.540.576,18 da Fundação Renova, para arcar com despesas diversas relacionadas ao rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, em 5 de novembro de 2015. A decisão do juiz Bruno Henrique Tenório Taveira, da comarca de Ponte Nova, atende em parte pedido liminar dos poderes executivos locais.
O rompimento da Barragem de Fundão, em Mariana, atingiu cerca de 40 municípios
A Fundação Renova foi constituída pela Samarco Mineração S.A. e por suas operadoras, as empresas Vale S.A. e BHP Billiton Brasil Ltda., para reparar os danos causados pelo evento, considerado até então o maior desastre socioambiental do Brasil.
Nas ações, os municípios afirmam que não assinaram os termos de ajustamento de conduta celebrados na ocasião, mas enfrentaram dificuldades financeiras decorrentes do incidente e da falta de repasses do Estado. As prefeituras alegam que vinham sendo pressionadas a fazer um acordo com a entidade, desistindo de causa que tramita na Justiça do Reino Unido e renunciando à propositura de ações futuras como requisito para receber valores.
Os gestores solicitaram, liminarmente, que a Renova cesse a coação para que os municípios abram mão de ajuizar ações contra as companhias envolvidas; pague, sem impor condições, a quantia correspondente a gastos adicionais transferidos ao poder público por causa do rompimento; e deixe de ofertar aos cidadãos atingidos composição que exija que eles desistam de direitos, no Brasil e/ou no exterior. Eles pedem, ainda, que os acordos já assinados sejam declarados nulos no que concerne a essa cláusula.
Fundamento
O juiz Bruno Taveira considerou que, uma vez que as ações giram em torno dos gastos extraordinários que os municípios tiveram em virtude da tragédia promovida pela Samarco, a competência era da justiça estadual (no caso, da comarca à qual as cidades atingidas pertencem).
O juiz Bruno Taveira viu sinais de uma “atuação disfuncional” da Fundação Renova O magistrado aceitou o argumento dos municípios de que o rompimento da barragem, além de ceifar vidas, violou diversos direitos fundamentais, na medida em que prejudicou o comércio local e aumentou a demanda sobre serviços de saúde e a proliferação do lixo e das pragas causadoras de doenças, destruindo vias urbanas e rurais e incrementando os gastos com transporte escolar e segurança.
Ele pondera que, conforme o próprio estatuto da entidade, cabe à Fundação Renova gerir e executar medidas para reparar ou minimizar os efeitos do desastre da Samarco, observando os princípios de legalidade, transparência, razoabilidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, economicidade e eficiência, e não proteger administrativa ou judicialmente as sociedades empresárias mantenedoras do Complexo de Germano.
Contudo, afirmou o juiz Bruno Taveira, apesar do objetivo institucional, vislumbra-se a possibilidade de uma utilização disfuncional da Fundação Renova. “De fato, passados mais de três anos do desastre da Samarco, não houve a devida reparação dos municípios atingidos pelo rejeito de mineração, que destruiu boa parte dos locais por onde a lama passou”, disse.
Quitação
O juiz avaliou que são obrigações da Renova o levantamento dos gastos extraordinários de cada município atingido, de acordo com os danos sofridos. E ainda a disponibilização da quantia apurada, momento em que se verificou “uma atuação aparentemente disfuncional, na medida em que a Fundação Renova exige a assinatura de cláusulas de ampla quitação, em atitude de inegável defesa da Samarco Mineração S.A., Vale S.A. e BHP Billiton Brasil Ltda., sociedades empresárias mantenedoras da fundação”.
Para o magistrado, a exigência de quitação a quaisquer outros direitos eventualmente existentes, inclusive danos futuros, e a impossibilidade de o município fazer novas reivindicações, em qualquer tempo e lugar, “é uma afronta ao gestor público responsável”. Ele acrescenta que o montante devido já foi fixado, em 10 de setembro de 2018, e ainda não foi transferido.
Fórum local: decisão é da comarca de Ponte Nova
Assim, mesmo que ainda não se possa declarar que houve coação, configura abuso do poder econômico oferecer ajuda, em momento de extrema dificuldade financeira dos municípios mineiros, para superar prejuízos causados pelas mineradoras, atrelando a reparação, já atrasada, à exigência de desistência de ações judiciais.
A conclusão do magistrado é que, diante desses indícios de uma atuação da Fundação Renova fora de seu objetivo institucional, na tentativa de proteger suas mantenedoras, e da necessidade dos municípios de obter recursos, justifica-se a concessão parcial da tutela antecipada.
Com isso, ele determinou o bloqueio da quantia de R$ 7.621.728,54 das contas da Fundação Renova e a transferência dos valores para as contas judiciais vinculadas aos processos.
Já em relação ao fim da coação, o juiz Bruno Taveira entendeu que a ordem judicial para isso e para o reconhecimento da nulidade da cláusula de desistência de ações já intentadas entram no mérito da ação e devem ser examinadas posteriormente.
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